18 Dez 2024

A retrospetiva de Jacques Demy que a Leopardo Filmes organiza a partir de 26 de dezembro no Cinema Medeia Nimas, em Lisboa, prolonga-se durante o mês de janeiro no Teatro Campo Alegre, no Porto, e noutras salas em Braga, Coimbra, Figueira da Foz, Setúbal, exibindo cópias digitais restauradas e filmes inéditos do cineasta no circuito comercial.

Um ciclo que inclui os títulos essenciais da obra do realizador francês e onde é vedeta a cópia digital restaurada em 4K por ocasião do 60.º aniversário de “Os Chapéus de Chuva de Cherburgo” que teve estreia mundial no Festival Cinema Ritrovato em Bolonha.

Entre o musical e o melodrama, Demy bebeu fundo no cinema clássico americano, no artificialismo do musical e das comédias ligeiras, mas adaptou essa herança a um estilo próprio, sensível, refinado e colorido. Ao longo da carreira, a imaginação poética de Demy criou um universo próprio, entre o sonho e a realidade, marcado por encontros e desencontros, amor dado e negado, sonhos concretizados e sacrificados.

Filmes do ciclo Jacques Demy

Lola (1961)
A Baía dos Anjos (1963)
Os Chapéus de Chuva de Cherburgo (1964) (4K)
As Donzelas de Rochefort (1967)
A Princesa com Pele de Burro (1970)
O Tocador de Flauta (1972) — estreia comercial
O Acontecimento Mais Importante desde que o Homem Chegou à Lua (1973)
Um Quarto na Cidade (1982) — estreia comercial
Parking (1985) — estreia comercial

E as curtas-metragens (todas em estreia comercial)
O Tamanqueiro do Vale do Loire (1956)
O Belo Indiferente (1958)
Ars (1960)
A Luxúria (1962)

No Cinema Medeia Nimas, em janeiro, serão também exibidas em sessões especiais os filmes “Trois places pour le 26” e “Model Shop” (Modelos de Aluguer).

Jacques Demy nasceu em 1931, em Nantes. Na década de 1960 estabeleceu-se como um dos principais nomes do cinema francês. Embora a sua obra não esteja diretamente inserida na Nouvelle Vague de que foi contemporâneo, partilha com essa geração de cineastas o espírito de experimentação e inovação que marcou o período e que foi decisiva na abordagem ao cinema daí em diante, um pouco por todo o mundo.

Assinou algumas curtas-metragens em finais dos anos 50, antes da primeira obra de grande fôlego, “Lola” (1961), com Anouk Aimée, a futura musa de Godard, onde já mostrava o seu olhar único. Em “A Grande Pecadora” (La Baie des Anges, 1963), Jeanne Moreau confirma um aspeto distintivo do trabalho de Demy — o protagonismo às histórias de mulheres.

Contudo, foi com “Os Chapéus de Chuva de Cherburgo” (Les Parapluies de Cherbourg, 1964), musical que mistura romance e tragédia, o artificialismo das canções com dramas pessoais e a realidade da Guerra na Argélia, que se tornou um nome de referência no cinema francês. Protagonizado por Catherine Deneuve e Nino Castelnuovo, o filme notabilizou-se pela forma como todo o diálogo é cantado. A escolha ousada confere à obra uma dimensão única, do lirismo à melancolia, conseguida graças à colaboração entre Demy e Michel Legrand, o compositor que ajudou a definir o estilo audacioso do cineasta.

Sucesso internacional, arrecadou diversos prémios, incluindo a Palma de Ouro no Festival de Cannes. A sua exploração do amor, da perda e da esperança tornou-se um marco no cinema, influenciando gerações de cineastas onde se incluem realizadores contemporâneos que continuam a explorar a fusão entre drama e música.

Demy continuou a relação com o musical, mas com uma abordagem mais ligeira e positiva no seu filme seguinte, “As Donzelas de Rochefort”, (Les Demoiselles de Rochefort, 1967), onde expande o seu estilo com um uso brilhante e único da cor e da composição visual. Os valores de produção desta ambiciosa fábula sobre duas irmãs em busca de romance só ficam completos com o capital americano da Warner Bros., um importante detalhe que permitiu ter Gene Kelly no elenco.

As novas amizades em Hollywood e as nomeações de “As Donzelas de Rochefort” para vários Óscares valem o convite para rodar um filme para a Columbia Pictures. “Modelos de Aluguer” (Model Shop, 1969) recupera a Lola da primeira longa-metragem de Demy, com Anouk Aimée a reencarnar a personagem. Empenhado em mostrar Los Angeles do ponto de vista de um europeu, o realizador cria um objeto demasiado estranho para o público local. O filme é um pequeno fracasso comercial e tem uma carreira discreta em França.

Demy regressa às origens. Sempre fascinado pela mistura entre realismo e fantasia, nas obras seguintes procura outros caminhos em “A Princesa com Pele de Burro” (Peau d’âne, 1970), “A Flauta Mágica” (The Pied Piper, 1972).

Sem perder o amor pela experimentação cinematográfica, Jacques Demy não repetiu os sucessos comerciais do início da carreira e experimentou dificuldade em arranjar apoio financeiro para os seus projetos.

Casado com a realizadora Agnès Varda, faleceu em 1990, aos 59 anos.

Será lembrado como um cineasta que soube transformar os aspetos mais simples da vida em poesia cinematográfica.

  • CINEMAX - RTP
  • 18 Dez 2024 09:15

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