Catherine Front no papel de Marguerite Dumont — entre a música e a loucura


joao lopes
29 Out 2015 19:35

"Drama de época"? "Comédia de costumes"? As expressões caíram em desuso e são até, por vezes, olhadas com alguma suspeição… Talvez porque os valores que arrastam pareçam ter-se transferido, em grande parte, para o espaço televisivo. Daí o misto de sedução e desilusão que um filme como "Marguerite" pode envolver: é uma tentativa de recriar aqueles modelos cinematográficos e, ao mesmo tempo, apresenta-se marcado pelas convenções menos empolgantes de séries e telefilmes.

Seja como for, sublinhemos o essencial. A saber: uma personagem realmente invulgar, tão fascinante quanto irrisória. Trata-se, assim, de fazer o retrato de Marguerite Dumont, uma dama que circula nas altas esferas da sociedade de 1920, exibindo os seus dotes de cantora de ópera… Com um pequeno problema: as suas competências para tão delicada tarefa são nulas.

O filme é menos uma caricatura da dimensão inapelavelmente ridícula de Marguerite e mais um inventário da sua trágica solidão. Isto porque o realizador Xavier Giannoli tem o cuidado (e, de alguma maneira, também o pudor) de não escamotear a componente mais visceral da personagem de Marguerite. A saber: o modo como ela acredita, realmente, no seu imaginário talento, num processo de auto-deslumbramento que ninguém quer contrariar e que, por fim, a aproxima da loucura.

Daí que tudo passe por Catherine Frot, de facto uma actriz capaz de sustentar o essencial do filme. Figura discreta, mas prestigiada, da produção cinematográfica francesa (com uma sólida formação teatral), ela representa Marguerite num misto calculado de exposição e ocultação. Já ganhou um César de melhor actriz secundária com "Un Air de Famille" (1996), de Cédric Klapisch — e não será uma surpresa se, graças a "Marguerite", conseguir, pelo menos, voltar a ser nomeada.

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