joao lopes
4 Set 2014 0:42
Mesmo não menosprezando (longe disso!) as maravilhas que conseguimos encontrar sempre em qualquer filme de Woody Allen, é difícil não pensar que os seus trabalhos regulares na Europa — desde "Match Point" (2005) — nem sempre terão sido feitos nas condições mais equilibradas ou mais propícias. Como se a intimidade de Nova Iorque desse lugar, deste lado do Atlântico, a uma superficialidade algo turística…
O certo é que, através de "Magia ao Luar", rodado no sul de França — com um notável trabalho de direcção fotográfica assinado por Darius Khondji —, Woody Allen reconcilia-se connosco. Aliás, em boa verdade, reconcilia-se com a sua própria arte da escrita, propondo uma aventura romântica que tem tanto de nostalgia do classicismo de Hollywood como de conto moral sobre a transparência e as máscaras do amor.
Tudo se passa em finais da década de 1920, num ambiente em que o bem-estar financeiro vai a par de uma crença chic nas forças do além… Stanley, interpretado por um Colin Firth de inesperada e deliciosa auto-ironia, é um ilusionista apostado em desmascarar Sophie, personagem que Emma Stone compõe com charme q. b., uma medium que se tornou famosa entre as famílias mais abastadas da Côte d’Azur.
Woody Allen filma o ziguezague da comédia romântica, não exactamente como uma antologia de personagens mais ou menos caricaturais, antes como um exercício filosófico em que cada um experimenta os limites, porventura o logro, da sua própria verdade. Daí o gosto de uma certa teatralidade que perpassa pelas situações do filme — cada ser humano existe, afinal, como personagem mais ou menos forjada para os outros.
O encanto de "Magia ao Luar" resulta desse cruzamento calculado entre o que se apresenta ligeiro ou mesmo frívolo e toda uma intensidade que, de uma maneira ou de outra, vai contaminando as relações humanas — além do mais, em tempo de tantos ruídos "especiais", é bom encontrar um filme capaz de devolver à palavra a sua singularidade expressiva e também o seu charme.