joao lopes
29 Out 2014 23:45
Bem sabemos que, para o melhor e, sobretudo, para o pior, muitas vivências de rua são, hoje em dia, objecto de tratamento mais ou menos estereotipado pelas televisões — os spots (breves e acelerados) parecem mesmo, por vezes, intermutáveis.
Digamos que um filme como "A Praça", de Sergei Loznitsa, pode ser um bom antídoto contra esse tipo de linguagem formatada. De facto, ele acompanhou os eventos da Praça da Independência, em Kiev, desde Novembro de 2013 até Fevereiro de 2014 (desembocando na queda do Presidente Viktor Yanukovych), procurando, não o clímax postiço, mas a complexidade das vivências humanas.
Dito de outro modo: "A Praça" não é um filme determinista, reduzindo o real a mecanismos repetitivos de espectáculo (?), mas sim um exercício de contemplação, observação e montagem em que, além de tudo o mais, importa preservar a densidade do tempo em que tudo ocorreu.
Em 2006, Loznitsa tinha assinado "O Cerco de Leninegrado", evocação dos 900 dias em que a população de Leninegrado resistiu às tropas de Hitler, apenas através de uma metódica organização de materiais de arquivo. Aqui, esse tipo de organização reaparece, com uma diferença, naturalmente, essencial: as imagens (e os sons) de "A Praça" resultam de uma experiência intensa, in loco, que se transforma em partilha cinematográfica.