Hugh Jackman: a última aventura cinematográfica de Logan?


joao lopes
2 Mar 2017 19:05

Começou a temporada de "blockbusters" de 2017… De uma maneira ou de outra, o espaço mediático irá lidar com os novos filmes de super-heróis e afins como matéria incontornável do mercado. Será mesmo incontornável? Quantos outros filmes serão penalizados por tal tendência?

Digamos, para simplificar, que Hugh Jackman está de volta ao seu "alter-ego", Logan/Wolverine, assumido em vários filmes, ao longo de quase duas décadas, desde que integrou o elenco de "X-Men" (2000), de Bryan Singer — agora, com "Logan", dirigido por James Mangold, trata-se, ao que parece, de encerrar (cinematograficamente) a história da personagem.
Importa reconhecer que Jackman e Mangold (também autor da história original) arriscaram apostar num registo claramente diferente dos filmes anteriores. Logan é, agora, um mutante que protagoniza uma existência de avassalador cansaço, vivendo, num futuro próximo, como motorista de uma limousine, ao mesmo tempo que tenta gerir a sua dependência de algumas substâncias. Tomando conta do envelhecido professor Charles Xavier (Patrick Stewart), vai ser surpreendido pela chegada de uma menina, Laura (Dafne Keen), que talvez não seja estranha às suas próprias origens…
Mangold é, obviamente, um cineasta consciente de que Hollywood tem uma história e um riquíssimo património de memórias. Afinal de contas, encontramos na sua filmografia títulos tão interessantes como "Copland" (1997), um sofisticado policial com Sylvester Stallone e Harvey Keitel, "Vida Interrompida" (1999), uma visão de uma instituição psiquiátrica que valeu um Oscar de melhor actriz secundária a Angelina Jolie, ou "Walk the Line" (2005), evocação de Johnny Cash com que Reese Witherspoon ganhou o seu Oscar de actriz principal.
Aliás, no caso de "Logan", numa das cenas, porventura querendo sugerir um modelo ideal, Mangold não resistiu a colocar num ecrã de televisão imagens de um filme clássico — "Shane" (1953), de George Stevens —, referência tanto mais desconcertante quanto será virtualmente indecifrável para a maior parte dos seus espectadores mais jovens.



Que está em jogo, então? A vontade, ou melhor, a possibilidade de transfigurar o universo de Wolverine (e, no limite, dos X-Men) num espectáculo que recupere os temas emblemáticos e a pulsação dramática dos clássicos westerns.

É, infelizmente, uma missão impossível para um filme que nunca aguenta a comparação com as matrizes que evoca — o western, convém não simplificar, não era apenas uma colecção de cenários mais ou menos pitorescos, mas sim um sistema narrativo de temas e valores indissociáveis do imaginário histórico e mitológico da nação americana. Supor que as componentes bélicas dos super-heróis se adequam "automaticamente" a tais referências é distracção formal ou ingenuidade cinéfila.
Em boa verdade, "Logan" acaba por ceder aos estereótipos de muitos filmes semelhantes, da primeira à ultima cena coleccionando pretextos para as (chamadas) cenas de "acção". Desta vez, com um bizarro suplemento figurativo: aumentando os esguichos de tinta vermelha ou o ruído agressivo das lâminas metálicas, este é um cinema que confunde a agressividade dos seus efeitos com a verdade mais íntima do espectáculo.

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