joao lopes
13 Mai 2017 1:18
Icare é uma criança que vive com a mãe alcoólica uma existência infeliz. Quase sempre sozinho no seu quarto, tem como passatempo a criação de construções com as latas de cerveja que a mãe consome em grande quantidade — ela chama-lhe "Courgette" e ele gosta disso. Um dia, de forma acidental, Icare provoca a morte da mãe, acabando por ser colocado numa instituição para órfãos…
Poderia ser a sinopse de um drama pungente, servido por interpretações em que sentimos a pele e o sangue das personagens. E é-o, num certo sentido, com uma pequena e sugestiva diferença: "A Minha Vida de Courgette" é um filme com bonequinhos animados (pela técnica stop motion), consagrado internacionalmente com muitas distinções, incluindo a de melhor longa-metragem de animação nos Prémios de Cinema Europeu — nos Oscars, nessa mesma categoria, esteve entre os nomeados mas não ganhou.
Filme perceptível apenas pelos adultos? Solução de compromisso entre a visão dos mais velhos e as sensibilidades dos mais novos? Em boa verdade, não creio que seja muito interessante "rotular" um objecto tão original a partir de especulações sobre o "seu" público — estamos, afinal, perante uma narrativa com elementos susceptíveis de mobilizar a atenção de qualquer espectador, de qualquer faixa etária.
Realizado pelo suíço Claude Barras, "A Minha Vida de Courgette" distingue-se pelo rigor das suas composições — nomeadamente no tratamento de gestos e olhares —, mas também pela precisão da sua narrativa. Confirma-se, aliás, uma velha máxima desta área de produção: independentemente das técnicas utilizadas, o trabalho de argumento é vital para a criação de um ambiente capaz de mobilizar o nosso olhar. Por isso, aqueles bonequinhos de movimentos sincopados são maravilhosamente humanos.