joao lopes
14 Set 2017 0:52
Eis um pequeno grande acontecimento no panorama da exibição do cinema português. E vale a pena sublinhar o adjectivo pequeno: trata-se, de facto, de dar a ver, em programa conjunto, três curtas-metragens que se têm distinguido nos últimos tempos, tanto em Portugal como no estrangeiro — ‘3 novas curtas portuguesas’ inclui:
* CIDADE PEQUENA, de Diogo Costa Amarante — consagrado com o Leão de Ouro do Festival de Berlim, tem no seu centro uma criança atormentada pelo pensamento de que as pessoas, afinal, podem morrer: um retrato íntimo em que a cidade, lugar urbano, é sobretudo uma paisagem interior.
* COELHO MAU, de Carlos Conceição — a vida de dois jovens, assombrada por sombras familiares que são, afinal, fantasmas sexuais, vai derivando para os domínios da fantasia — em última instância, a vibração dos corpos atrai as componentes tradicionais da fábula.
* FARPÕES BALDIOS, de Marta Mateus — em cenários do Alentejo, a relação com a terra é revista através do cruzamento de memórias mais ou menos remotas com a realidade crua do dia a dia; o filme participou na última edição do Curtas de Vila do Conde, tendo arrebatado o Grande Prémio da competição internacional.
Há uma espécie de "ameaça" narrativa que limita os resultados práticos dos três filmes: "Cidade Pequena" prefere o formalismo das composições à definição das personagens; "Coelho Mau" nem sempre consegue sustentar a dimensão de artifício que a fábula convoca; enfim, "Farpões Baldios", em vez de procurar edificar o seu próprio espaço, está marcado, plano a plano, pela obsessão de imitar (?) modelos de composição que vão de Straub a Pedro Costa.
Dito isto, importa ressalvar o sentido de pesquisa que, em qualquer caso, atravessa os três filmes. Mais do que isso: com resultados cinematográficos "melhores" ou "piores", esta é uma aposta de distribuição/exibição — assumida pela Midas Filmes — que possui um valor exemplar na actual conjuntura cinematográfica. Que valor? O gosto, a importância e a prática de dar a ver.