joao lopes
6 Ago 2016 3:41

Magnífica surpresa do Verão cinematográfico. Aliás, magnífica surpresa que nada tem a ver com as regras dominantes do Verão cinematográfico… "Experimenter" é um produto de excelência da área independente americana, com apoio dos festivais de Sundance e Tribeca, evocando as singularíssimas experiências do cientista Stanley Milgram (1933-1984), no começo da década de 1960, na Universidade de Yale, procurando descortinador o funcionamento da autoridade.

Numa descrição tão esquemática quanto possível, podemos dizer que Milgram criou situações em que um ser humano era investido de alguma autoridade (conferida pelas próprias regras da experiência) para "castigar" respostas erradas de outro ser humano a perguntas muito básicas — o "castigo" traduzia-se na aplicação de choques eléctricos cada fez mais fortes, até poder pôr em causa a sobrevivência do outro… Daí a pergunta fulcral: porque é que o primeiro continuava a agredir o segundo?

Escrito e realizado por Michael Almereyda — conhecido, sobretudo, pelo filme de terror "Nadja" (1994) —, "Experimenter" consegue a proeza de conciliar um minucioso realismo na descrição das situações com um assumido artificialismo cinematográfico. No limite, tal dialéctica confere também ao filme uma dimensão experimental em que o cinema se apresenta como uma via paradoxal de acesso à sedução e assombramento das relações humanas.

Nada disto se esgota numa qualquer visão "teórica", já que Almereyda se mantém atento à pulsação dos corpos e à acutilância das palavras. Fundamental, por isso, é o trabalho do excelente elenco, liderado por Peter Sarsgaard e Winona Ryder, respectivamente nos papéis de Milgram e sua mulher — este é, afinal, um exercício cinematográfico que, parafraseando o poeta, se estranhe e depois… entranha.

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