Fabrice Luchini — história de um homem apressado


joao lopes
6 Jul 2019 0:01

Estranho fenómeno dos nossos dias: há filmes que parecem não acreditar nos elementos dramáticos com que trabalham, a ponto de se sentirem "obrigados" a promover tais elementos a uma condição "simbólica" que, em última instância, acaba por desvalorizar a sua singularidade. Assim acontece no curioso, mas muito limitado, "Segunda Vida", inspirado na experiência verídica de Christian Stieff.

Quando ocupava o cargo de presidente do grupo Peugeot, em França, Stieff sofreu um AVC que lhe deixou uma perturbante sequela: deixou de ser capaz de construir frases coerentes, a ponto de baralhar mesmo as sílabas das palavras… Para ele, tratou-se de seguir uma profunda terapia (da fala) e, mais do que isso, de reaparender o valor das relações humanas.

 

Para fazer "Segunda Vida" — título original: "Un Homme Pressé" (à letra: ‘Um homem apressado’) — o argumentista e realizador Hervé Mimran pôde contar com um contributo invulgar que, em boa verdade, salva o filme do maniqueísmo fácil. É ele o veterano Fabrice Luchini que compõe a figura central (inspirada em Stieff, mas de nome Alain Wapler) com uma precisão que não desarma mesmo quando os seus dramas de expressão adquirem componentes burlescas.

Infelizmente, à maneira de muitas ficções "telenovelescas", o filme insiste em distanciar-se dos detalhes da personagem para elaborar um conto moral (?) sobre a transparência e as máscaras dos pobres humanos… Mesmo a personagem da terapeuta (Leïla Bekhti) acaba por ser instrumentalizada como elemento "demonstrativo". É um prazer assistir ao trabalho de Luchini, mas é pena também que uma história tão tocante dê origem a um objecto de cinema tão limitado.

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