19 Nov 2020 23:54
Fellipe Barbosa, cineasta brasileiro, nascido no Rio de Janeiro há 40 anos, continua na actualidade das salas. Depois de termos descoberto o seu primeiro filme, "Casa Grande" (2014), um drama centrado na decomposição afectiva e financeira de uma família, "Gabriel e a Montanha" (2017) surge como um contraste absoluto — a provar que ele é, pelo menos, um cineasta que arrisca na procura de diferentes formas narrativas.
Para apresentarmos um filme como "Gabriel e a Montanha", é forçoso revelarmos aquilo que, em termos temporais, é o seu final. Ou seja: esta é a história verídica da aventura de Gabriel Buchman, brasileiro, 28 anos; antes de iniciar o seu doutoramento em políticas públicas para os países em desenvolvimento, decide fazer uma grande viagem através da zona leste do continente africano — quase um ano após o início dessa viagem, e depois de estar desaparecido durante 19 dias, seria encontrado morto no Monte Mulanje, no Malawi, próximo da fronteira com Moçambique.
Não se julgue que, ao avançarmos com esta informação, estamos a revelar o que quer que seja do filme. Isto porque essa morte, aparentemente devida a hipotermia, é o ponto de partida que o realizador cita em todas as intervenções públicas sobre o seu trabalho — além disso, "Gabriel e a Montanha" dura um pouco mais de duas horas e a descoberta do corpo morto de Gabriel é, precisamente, assunto da cena de abertura.
Fellipe Barbosa era muito amigo de Gabriel Buchman. O seu filme nasce da tentativa de compreender o sentido da própria viagem de Gabriel, dessa verdadeira odisseia que o levou a percorrer vários países — Quénia, Tanzânia, Zâmbia e Malawi —, dir-se-ia na procura de uma utopia existencial que, durante algum tempo, foi partilhada com Cristina, a sua namorada.
Os resultados cinematográficos são dispersos, desequilibrados, algo à deriva, apenas com alguns momentos dramaticamente intensos. Ainda assim, importa reconhecer que estamos perante um objecto de cinema que procura explorar um curioso registo, a meio caminho entre a memória e a parábola, a ficção e o documentário — até porque apenas Gabriel e Cristina são interpretados por actores profissionais, respectivamente João Pedro Zappa e Caroline Abras; os intérpretes africanos são todos eles amadores.