joao lopes
29 Dez 2018 22:21
Foi com um misto de entusiasmo e desilusão que, em Maio de 2017, no Festival de Cannes, descobrimos "O Amante Duplo", de François Ozon. Estávamos perante um cineasta em pleno controle das suas componentes temáticas — a começar por um romantismo em permanente conflito com os enigmas da sexualidade —, ao mesmo tempo correndo o risco de se esgotar num processo algo simplista de citações (por vezes, da sua própria obra).
Mais de um ano depois, com a chegada do filme às salas portuguesas, talvez seja inevitável sublinhar que, apesar de alguns momentos brilhantes de mise en scène, o filme reflecte um impasse na trajectória criativa de Ozon. Dir-se-ia que o cineasta que já nos deu coisas tão invulgares como "Sob a Areia" (2000), "Cinco Vezes Dois" (2004) ou "Jovem e Bela" (2013) corre o risco de se encerrar num "sistema" fechado e repetitivo.
"Jovem e Bela", justamente, suscita um imediato paralelismo. Isto porque Ozon volta a dirigir Marine Vacth, actriz de uma juventude enigmática, dir-se-ia assombrada por um tempo primitivo, contaminado por um erotismo imponderável e fantasmático. Desta vez, descobrimo-la envolvida numa teia de ambiguidades (ou duplicidades, para aplicarmos a informação do título) que nos remete para as heranças de Alfred Hitchcock e Brina De Palma.
Não vem grande mal ao mundo pelo facto de Ozon escolher, assim, os seus mestres. O certo é que, ao longo de diversas situações de "O Amante Duplo" — em que Vacth tenta decifrar o que esconte o seu psicanalista/amante —, vamos sentindo que as relações entre as personagens contam menos do que a exibição de uma agilidade formal sempre a derivar para o formalismo… Digamos, para simplificar, que acontece aos melhores.