joao lopes
16 Mar 2017 2:21
Convenhamos que não era fácil… Ao apostar na recuperação de "A Bela e o Monstro", agora com actores de carne e osso, os estúdios Disney não se limitavam a colocar a fasquia bem alto — afinal de contas, a versão animada, lançada em 1991, é uma das referências lendárias da sua história moderna. Ao mesmo tempo, tratava-se de um confronto com um texto emblemático do universo das fábulas, publicado em 1756 por Jeanne-Marie Leprince de Beaumont.
O menos que se pode dizer do novo filme é que se trata de uma das melhores "transposições" do desenho para a imagem real, a par de "Maléfica" (2014), com Angelina Jolie. Claro que a estrutura do desenho animado foi conservada de modo quase obsessivo, aliás reintegrando as magníficas canções compostas pela dupla Alan Menken/Howard Ashman. Em qualquer caso, não estamos perante uma mera cópia, antes face a uma celebração dos próprios meios de fantasia que o cinema proporciona.
Nesta perspectiva, a realização de um cineasta tão irregular como Bill Condon tem o mérito da eficácia (foi ele que dirigiu, por exemplo, os dois medíocres capítulos finais da saga "Twilight"). Dito de outro modo: tratava-se de tirar o máximo partido das possibilidades de espectáculo do estúdio, com todas as formas de manipulação hoje em dia disponíveis, sem menosprezar a dimensão clássica da fábula.
Será esse, aliás, o aspecto mais feliz desta nova versão: sustentar o misto de encanto e perturbação decorrente da história da Bela que poderá devolver o Monstro à sua figura humana, sem nunca alienar o fôlego musical de todo o projecto. Com alguma ironia, podemos mesmo considerar que, depois do impacto de "La La Land", encontramos em "A Bela e o Monstro" uma muito mais interessante reconversão do género musical.
Emma Watson garante a conjugação de sobriedade e alegria que a personagem de Bela exige, sendo Dan Stevens um Monstro que resiste ao facto de, na prática, quase só o vermos em versão "monstruosa". Sublinhe-se também a riqueza das vozes, com destaque para Ewan McGregor e Ian McKellen, respectivamente como o Candelabro e o Relógio que habitam o castelo do Monstro. Isto sem esquecer o admirável Kevin Kline, num regresso que se celebra como pai de Bela.
Além do mais, esperemos que este retorno a "A Bela e o Monstro" possa trazer novos espectadores à belíssima versão de 1946, assinada por Jean Cocteau — Josette Day e Jean Marais eram os intérpretes principais.