joao lopes
23 Jun 2019 0:09
De "Os Incorruptíveis Contra a Droga" (1971), de William Friedkin, a "Traffic" (2000), de Steven Soderbergh, quando falamos de abordagem dos circuitos das drogas, falamos, sobretudo, de produções do cinema americano. "Pássaros de Verão", filme vencedor do Festival de Havana de 2018, é um objecto que nos pode ajudar a corrigir essa visão.
Estamos, de facto, perante uma produção de raiz colombiana, aliás assinada por um dos mais conhecidos cineastas da Colômbia: Ciro Guerra. Descobrimo-lo com o magnífico "O Abraço da Serpente" (2015), nomeado para o Óscar de melhor filme estrangeiro. Agora, Ciro Guerra reparte as tarefas de realização com Cristina Gallego, colaboradora regular dos seus filmes anteriores, em especial na área da produção.
E não surpreenderá se dissermos que encontramos, aqui, uma fundamental diferença temática. Não se trata, de facto, de dar conta do tráfico de drogas no interior dos EUA, mas sim de observar o que, por assim dizer, constitui a sua retaguarda. Em cena está o enriquecimento de uma família indígena através da venda de drogas (ao longo das décadas de 1960/70) e, a partir de certa altura, uma guerra aberta com aqueles que disputam o seu poder.
Mais do que um "thriller", trata-se de uma tragédia: através do conflito que se instala, deparamos com uma lenta decomposição do próprio tecido cultural da comunidade indígena e, no limite, o abandono dos seus valores mais ancestrais. "Pássaros de Verão" reflecte, assim, uma exemplar exigência realista, afinal presente nas mais diversas cinematografias do nosso tempo.