joao lopes
18 Jul 2015 0:59

Hoje em dia, conhecemos alguns autores mexicanos — como Alejandro González Iñárritu ("Birdman") ou Alfonso Cuarón ("Gravidade") — através das suas proezas no interior da grande máquina de produção de Hollywood. Mas não se julgue que isso resulta de qualquer descaracterização do cinema do México. Bem pelo contrário: Iñárritu e Cuarón são, afinal, personalidades provenientes de um contexto que continua a revelar novos autores e interessantíssimas experiências.

Aí temos, agora, o caso de Alonso Ruiz Palacios, com o filme "Güeros", consagrado com alguns dos prémios principais da produção mexicana referente a 2014. Assim, não só "Güeros" foi eleito o melhor filme do ano, como Palacios obteve duas importantes distinções, numa acumulação pouco comum: a de revelação do ano (ele tinha feito algumas curtas-metragens e trabalho documental) e a de melhor realizador.




Atravessado pelas atribulações de uma greve de estudantes, o filme tem como motor da acção o facto de um adolescente ser enviado para a Cidade do México, para viver durante algum tempo com o irmão, estudante universitário. Dir-se-ia a crónica de uma crise familiar que, subitamente, se transfigura em parábola desencantada sobre um modo de vida carente de organização e motivação, marcado por muitas ilusões e desilusões — a palavra güeros, designando na gíria uma pessoa alourada e pálida, surge, afinal, como designação simbólica dos que parecem não encontrar nem lugar nem projecto de vida.
Apresentado no Festival de Berlim, e também no Indie Lisboa, "Güeros" corresponde, afinal, a um olhar que, conservando o gosto de uma aproximação documental — ou talvez mais correctamente: realista —, acaba por atrair uma dimensão poética que transcende os clichés dramáticos, ou até ideológicos, em que as personagens poderiam encaixar. A opção pela fotografia a preto e branco envolve, por isso, uma calculada ambiguidade — é o sinal de um mundo tecido de coisas evidentes e enigmas por desvendar.

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