Willem Dafoe e Robert Pattinson nos espaços assombrados de

crítica

Realismo & fantástico

Robert Eggers retrata a solidão partilhada por dois homens que, na Nova Inglaterra, em finais do século XIX, tomam conta de um farol: a aposta em passar do realismo para o domínio do sonho é curiosa, mas está longe de ser bem resolvida.

Quando olhamos para as reproduções de fotogramas do filme "O Farol" ["The Lighthouse"], de Robert Eggers, somos tocados pela sedutora estranheza da paisagem, pela vibração dos volumes, pela intensidade dos rostos dos dois actores — Willem Dafoe e Robert Pattinson — e também, claro, pelas nuances da fotografia a preto e branco. Aliás, convém lembrar que o filme valeu a Jarin Blaschke uma nomeação para o Oscar de melhor fotografia (ganho por Roger Deakins, pelo seu trabalho em "1917", de Sam Mendes).

Resta saber como é que essa "fotogenia" se liga com a narrativa do próprio filme e, em particular, com o crescendo dramático que nele se tenta construir. Convém lembrar que esta é uma invulgar história de solidão, situada nos anos finais do século XIX. A saber: Dafoe e Pattinson interpretam personagens que têm por missão tomar conta de um farol na costa da Nova Inglaterra e o menos que se pode dizer é que as condições climatéricas vão gerando uma tensão capaz de atrair a claustrofobia e a alucinação.

O filme é, obviamente, em termos práticos, um arriscado exercício, quanto mais não seja porque se vai tornando claro que toda a equipa (a começar pelos actores, naturalmente) teve de enfrentar condições agrestes de rodagem. O certo é que a sua dimensão visual acaba por ser pouco para sustentar aquilo que seria uma perturbante componente fantástica: este é, afinal, um conto de assombramento em que os humanos são atingidos pela sedução letal das sereias que vêm das profundezas do mar…

Eggers terá tentado construir um filme de austero realismo para, a pouco e pouco, instalar as marcas de um mundo onírico e, por assim dizer, "alternativo". Reencontramos as limitações da sua anterior longa-metragem, "A Bruxa" (2015): as sequências das sereias surgem como piruetas narrativas cujo simplismo figurativo e dramático contrasta com a tensão que, apesar de tudo, alguns momentos conseguem sugerir. Para a história, registe-se que houve quem apostasse em Dafoe como um dos nomeados para o Oscar de melhor actor — como sabemos, tal não aconteceu.