9 Mai 2016 0:44
Numa entrevista ao site IndieWire sobre o seu filme "Viver à Margem" (título original: "Time Out of Mind"), o realizador e argumentista Oren Moverman colocava uma questão fulcral a propósito da sua personagem central, um sem-abrigo em Nova Iorque: "Se ele pode desaparecer, tornar-se invisível, ser ignorado e transformar-se nesse buraco negro em torno do qual as pessoas circulam, sem querer lidar com ele, sem que ninguém olhe para ele, o que é que isso diz sobre o resto de nós?"
Estamos, assim, perante um filme que, com uma frieza quase clínica, observa uma conjuntura em que a aceleração das trocas sociais corresponde, de facto, a uma decomposição, para não dizer a um esvaziamento, das relações humanas. A odisseia de George, interpretado por um brilhantíssimo Ricahrd Gere, é, afinal, uma história protagonizada por um ser humano que se vê desapossado de tudo o que define uma identidade.
"Viver à Margem" organiza-se como uma colagem de situações que correspondem a outros tantos impasses. Maggie (Jena Malone), filha de George, o companheiro Dixon (Ben Vereen) ou Art (Steve Buscemi), especialista em acções de despejo, surgem como figuras de um xadrez afectivo e social em que já nada parece corresponder a uma genuína troca — como se a indiferença do colectivo tivesse esmagado as singularidades individuais, impondo uma solidão sem recurso.
Com uma brilhante carreira também como argumentista — por exemplo, em "I’m Not There" (Todd Haynes, 2007) e "Love & Mercy" (Bill Pohlad, 2014) — Moverman prossegue uma linha dramática iniciada com as suas duas primeiras realizações, "O Mensageiro" (2009) e "Rampart – o Renegado" (2011). Ele é um exemplo modelar de um realismo à flor da pele que, em todo o caso, não perdeu o gosto pelas nuances psicológicas — e também, claro, por um sofisticado trabalho de direcção de actores.