27 Fev 2020 16:00
A sugestão de "sombras chinesas" a propósito de um filme policial chinês constitui, por certo, uma associação com o seu quê de automático. Ainda assim, valer a pena acrescentar que, no caso de "O Lago dos Gansos Selvagens", a sua aplicação adquire especial pertinência — desde logo, porque o realizador, Diao Yi’nan, sabe explorar um certo claro/escuro que nos remete para a tradição (ocidental/oriental) do filme "noir"; depois, porque se trata de contar uma história em que os elementos ocultos podem ter tanta, ou mais, importância que a percepção do visível.
Apresentado na edição de 2019 do Festival de Cannes, com Diao Yi’nan a assumir também as tarefas de argumentista, "O Lago dos Gansos Selvagens" propõe uma abordagem do submundo do crime, muito para além de clichés mediáticos ou ideológicos. A sua miscigenação de referências temáticas e estilísticas talvez não possa ser desligada do facto de estarmos também perante um exemplo sintomático da actual "internacionalização" da produção cinematográfica — esta é uma co-produção com a França, mesmo se tudo o que acompanhamos é visceralmente chinês.
Porventura exibindo marcas de alguma influência de Quentin Tarantino (ele próprio um discípulo da tradição de géneros de Hollywood, incluindo, justamente, o "noir"), Diao Yi’nan faz o retrato de um homem e uma mulher (Liao Fan e Lun Mei Gwei, ambos excelentes) enredados nos acontecimentos desencadeados por uma morte que, de uma maneira ou de outra, vai abalar o destino de todas as personagens…