joao lopes
2 Ago 2014 0:58
O menos que se pode dizer de Philippe Garrel — nome ligado ainda à Nova Vaga francesa, mas com um trajecto exterior a qualquer "movimento" — é que se trata de um cineasta que trabalha, obsessivamente, sobre modelos tão austeros quanto fascinantes. Se pensarmos, por exemplo, nos seus títulos mais recentes — como "Os Amantes Regulares" (2005) ou "A Fronteira do Amanhecer" (2008) —, observamos a paciente e delicada construção de histórias centradas nas feridas internas do amor.
"Ciúme" (2013), lançado por uma nova pequena distribudora que parece apostada numa singularíssima actividade (Legendmain), aí está para uma (re)descoberta de Garrel que, no limite, confirma a sua solidão no contexto da actual produção francesa: um filme construído a partir de uma teia de relações em que o amor — ou melhor, a possibilidade do amor — é, de uma só vez, o tema e o mistério.
O motor da história é muito simples, envolvendo, no essencial, quatro personagens: um casal que se separa + a filha de ambos + a mulher com quem o homem passa a viver. A partir de tal conjuntura afectiva, Garrel vai deambulando como um cientista que detecta a transparência e também as máscaras da vida amorosa, tudo como quem desenvolve uma "reportagem" que, afinal, coincide com uma metódica interrogação filosófica.
Como sempre, os actores são vitais nos resultados, sendo inevitável destacar Louis Garrel, filho do realizador, e Anna Mouglalis (que conhecemos, em 2009, através de "Coco Chanel & Igor Stravinsky") — a sua exposição supera qualquer cliché "psicológico", dando a ver o entrelaçado do desejo e da moral, da família e da sociedade. isto, claro, sem esquecer, as nuances das prodigiosas imagens a preto e branco, assinadas por esse notável director de fotografia belga que é Willy Kurant.