29 Out 2020 22:37
A história do filme "Aznavour por Charles" começou poucos anos antes do seu falecimento (em 2018, contava 94 anos). Na sequência de várias colaborações com Marc di Domenico, produtor musical e realizador, Charles Aznavour decidiu partilhar com ele um pequeno tesouro privado. Ou seja: nada mais nada menos que os seus registos pessoais, feitos ao longo de várias décadas com câmaras Super 8 e 16 mm — foi Edith Piaf que, em 1948, lhe ofereceu a sua primeira câmara "amadora".
Na prática, Aznavour estava a fazer um especialíssimo legado, oferecendo a di Domenico a possibilidade de transformar o seu tão íntimo património em objecto de cinema. Assim é "Aznavour por Charles", intitulado no original "Le Regard de Charles". Dito de outro modo: estas são memórias do olhar (cinematográfico) de uma das personalidades mais lendárias da canção francesa.
Estranhamente, o filme parece não acreditar muito nas singularidades do seu próprio material. Assim, foi elaborado um comentário, lido por Romain Duris, que raras vezes se revela pertinente, ou apenas útil para seguirmos os registos feitos por Aznavour. Há mesmo momentos bizarros em que esse comentário nem sequer identifica grandes estrelas (por exemplo, Kirk Douglas) que vão surgindo nas imagens…
Seja como for, "Aznavour por Charles" fica como um elemento mais na filmografia de Aznavour, ele que teve também uma irregular, mas curiosa, carreira como actor, surgindo em títulos tão marcantes como "Disparem sobre o Pianista" (1960), de François Truffaut, em período eufórico da Nova Vaga, e "Os Fantasmas do Estrangulador" (1982), de Claude Chabrol. Dir-se-ia que os seus filmes, agora divulgados, possuem uma dimensão genuinamente auto-biográfica.