Saoirse Ronan e Greta Gerwig — rodagem de


joao lopes
9 Mar 2018 14:09

Que faz uma actriz quando filma outras actrizes?… Pois bem, cria condições práticas e conceptuais, objectivas e subjectivas, para valorizar o seu trabalho. É isso mesmo que acontece em "Lady Bird", filme de Greta Gerwig, centrado em duas belíssimas composições de Saoirse Ronan e Laurie Metcalf — as suas cinco nomeações para os Oscars, além da categoria de melhor filme, foram, aliás, para Gerwig (realização e argumento original), Ronan e Metcalf (actriz e actriz secundária, respectivamente).

Vale a pena recordar que conhecemos Gerwig, antes do mais, através dos filmes de Noah Baumbach, com destaque para "Frances Ha" (2012). Vimo-la também, por exemplo, em "Para Roma, com Amor" (2012), de Woody Allen, "A Humilhação" (2014), de Barry Levinson, ou "Mulheres do Século XX" (2016), de Mike Mills — e sempre com um misto de gravidade e ironia que a inclui numa multifacetada tradição que vai de Judy Hollyday a Jane Fonda.

A vibração emocional de "Lady Bird" decorre, por certo, de alguma dimensão auto-biográfica. Ou melhor: Gerwig filma uma relação mãe/filha que tem a sua cidade-natal — Sacramento, California — como cenário principal, mesmo se toda a história surge atravessada pelo desejo da filha rumar a Nova Iorque, eventualmente seguindo uma carreira nas artes dramáticas.
"Lady Bird" está marcado por muitas situações que, como é óbvio, identificamos como típicas de um modelo de (melo)drama familiar em que as clivagens entre gerações desempenham um papel determinante. Ao mesmo tempo, Gerwig e as suas actrizes escapam a qualquer cliché, mantendo o filme num registo de contrastes e surpresas que, em última instância, revaloriza uma matriz narrativa enraizada no património de Hollywood, em particular num certo cinema social & realista das décadas de 60/70.
Na cerimónia dos Oscars, "Lady Bird" não obteve qualquer distinção. Mas não foi, de modo algum, um dos "derrotados" da noite. Aliás, vale a pena contrariar a noção moralista segundo a qual os prémios da Academia de Hollywood são uma espécie de corrida "futebolística" para consagrar os que ficam em primeiro lugar… A sua simples presença nas nomeações serviu de testemunho e símbolo de um cinema genuinamente independente que não desiste de filmar os seres humanos e as suas contradições — com alegria e tristeza, drama e humor.

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