Um dos princípios de diversificação que, a partir de certa altura, foi adoptado pelo Festival de Curtas-Metragens de Vila do Conde envolve o reconhecimento de que, muitas vezes, depois das curtas vêm as… longas.
Este ano, na secção ‘Da curta à longa’, o CURTAS apresenta em ante-estreia títulos como:
— "O Outro Lado da Esperança", de Aki Kaurismäki, um drama em que ecoam as histórias dos refugiados na Europa do presente.
— "Certain Women", histórias cruzadas de três mulheres interpretadas por Kristen Stewart, Michelle Williams e Laura Dern, sob a direcção de Kelly Reichardt.
— "Mariphasa", nova longa-metragem de Sandro Aguilar, precisamente um dos autores portugueses cuja exposição pública tem sido indissociável de Vila do Conde.
Um destaque muito especial vai para "24 Frames", o filme póstumo do iraniano Abbas Kiarostami que, há poucas semanas, foi revelado em Cannes.
"24 Frames" é, de uma só vez, o mais simples dos filmes e o mais difícil de descrever. Por um lado, seguindo uma lógica contemplativa que já tinhamos encontrado em "Five" (2003), Kiarostami propõe pequenos quadros vivos de cenas mais ou menos naturais; por outro lado, tais quadros não são, em rigor, registos de uma determinada acção — partem de uma imagem fixa (quase sempre uma fotografia) para, através de processos de manipulação digital, gerar uma breve "ficção".
Como todos os grandes autores modernos (incluindo Godard e Fincher) que questionam os limites das imagens e sons do cinema, Kiarostami é levado a desafiar a fronteira que, tradicionalmente, separa Natureza e Narrativa. Dito de outro modo: "24 Frames" celebra a possibilidade de o cinema voltar a ser uma caixa mágica capaz de transfigurar as aparências do mundo.