8 Abr 2020 19:07
Vimo-lo sempre como secundário, "quase" principal, capaz de expor as dimensões mais enigmáticas de personagens plenas de contrastes: o actor americano Allen Garfield faleceu no dia 7 de abril, vitimado por covid-19; vivia no Motion Picture Home (Woodland Hills, Califórnia), um lar para ex-profissionais de cinema e televisão — contava 80 anos.
Com uma sólida formação do Actors Studio e uma grande experiência de palco, Garfield (cujo verdadeiro apelido era Goorwitz) possui uma filmografia imensa, de mais de uma centena de títulos, repartida entre produções cinematográficas e televisivas. Entre as suas personagens mais emblemáticas, incluem-se o empresário de uma cantora "country" em "Nashville" (1975), de Robert Altman [trailer], o produtor cinematográfico de Los Angeles em "O Estado das Coisas" (1982), de Wim Wenders, e o contabilista do crime organizado em "Cotton Club" (1984), de Francis Ford Coppola.
Nunca reconhecido na temporada de prémios (Óscares e Globos de Ouro não fazem parte da sua biografia), Garfield surgiu em muitos filmes marcantes na evolução de Hollywood, em particular ao longo da agitada década de 70. Eis algumas dessas memórias:
* HI, MOM! (1970) — com a guerra do Vietname em pano de fundo, a meio caminho entre comédia e drama, é um dos primeiros títulos da filmografia de Brian De Palma; Robert De Niro lidera o elenco.
* BANANAS (1971) — sobre uma delirante rebelião política, algures num país da América do Sul, trata-se da segunda longa-metragem de e com Woody Allen, exemplificando as suas raízes burlescas.
* O VIGILANTE (1974) — centrado na personagem de um especialista em escutas da vida privada (interpretado pelo genial Gene Hackman), é um dos filmes mais contundentes e perturbantes de Coppola [trailer].
* DO FUNDO DO CORAÇÃO (1981) — De novo sob a direcção de Coppola, na sua obra-prima maldita, verdadeiro musical operático, revolucionário na técnica e na narrativa — Garfield é o dono do restaurante.
* DICK TRACY (1990) — a admirável reinvenção da personagem do detective de sobretudo amarelo, vindo do universo da BD — com Warren Beatty (também realizador), Madonna e Al Pacino.
* ATÉ AO FIM DO MUNDO (1991) — Outra vez com Wenders, uma parábola actualíssima sobre a decomposição do mundo clássico das histórias e utopias; com uma sequência rodada em Lisboa, no cinema Eden.
* THE MAJESTIC (2001) — melodrama de muitos paradoxos, centrado na sala de cinema de uma cidadezinha esquecida, centra-se numa das mais sofisticadas composições de Jim Carrey — realizado por Frank Darabont [trailer].