joao lopes
11 Jan 2019 23:40
Situação insólita e desconcertante — é difícil lidar com alguns documentários actuais (das mais diversas origens geográficas e culturais) sem chamar a atenção para a própria simplificação do labor documental que neles se reflecte. Dir-se-ia que os sofisticados recursos das actuais câmaras de filmagem (permitindo filmar em qualquer contexto, dia ou noite) instalou a ideia de que documentar é apenas acumular registos de situações mais ou "sugestivas" do quotidiano das personagens eleitas.
Escusado será sublinhar que "Terra Franca", de Leonor Teles, é um acontecimento que mostra que, apesar das muitas limitações da produção portuguesa, continua a ser possível, aos 26 anos, uma jovem assinar o seu primeiro trabalho de longa-metragem. Mais do que isso: estamos perante alguém que, obviamente, não cedeu à pressão real e simbólica do universo "telenovelesco" que vai asfixiando sectores importantes do cinema português.
Acontece, porém, que seria preciso um pouco mais do que reunir uma pequena colecção de "sketches" mais ou menos ligeiros, por vezes à beira do anedótico, sobre o dia a dia de Albertino Lobo e sua família numa comunidade piscatória do Tejo… Como se o desejo de reportagem tivesse cedido à noção de que a realidade, espontaneamente (?), irá expondo a sua complexidade laboral, económica ou simbólica.
É possível acreditar que "Terra Franca" foi feito com imenso carinho por aquela realidade e evidente dedicação às suas pessoas. Não é isso que está em causa. O certo é que, quando chegamos ao genérico final e deparamos com as fotografias familiares de Albertino Lobo, subitamente encontramos objectos que se distinguem por uma tocante verdade interior — tal verdade acabou por ficar como mera pontuação "decorativa" desse genérico quando, afinal, seria a matéria primordial de um projecto deste género.