joao lopes
5 Jul 2018 0:27
Convenhamos que nunca seria fácil transpor para uma narrativa cinematográfica as subtilezas de um livro como "Na Praia de Chesil", de Ian McEwan. O seu retrato da lua de mel de um jovem casal britânico, corria o ano de 1962, implicaria sempre algum ziguezague temporal e dramático que não se consegue apenas "imitando" as estruturas literárias.
O filme resultante, dirigido por Dominic Cooke, não sendo uma obra-prima (para citarmos apenas o mais óbvio, há vários tempos narrativos articulados de modo algo precário), consegue, pelo menos, reavivar uma certa tradição britânica de relação com os materiais literários que terá em David Lean (1908-1991) a sua referência mais emblemática. E podemos acreditar que para os seus resultados não será estranha a contribuição do próprio McEwan — foi ele, de facto, quem adaptou o seu romance.
Como é dito logo nas primeiras linhas do romance, e cedo se torna óbvio no filme, Florence (Saoirse Ronan) e Edward (Billy Howle) vivem assombrados pela sua inexperiência sexual. De tal modo que se entregam aos seus primeiros momentos de intimidade como um misto de pânico e obrigação — pânico de nada saberem do desejo do outro e, no fundo, do seu próprio desejo; obrigação de cumprirem a lógica conjugal decorrente das regras familiares e sociais.
É uma dolorosa aventura de impossível romantismo. Livro e filme partilham esses silêncios, entre a supresa e o embaraço, que fazem com que Florence e Edward se sintam a enfrentar momentos que, de uma maneira ou de outra, vão marcar toda a sua existência futura. Destaque-se, por isso, a contenção, carregada de muitas emoções, com que os actores principais assumem as suas personagens — Ronan em mais uma demonstração do seu sofisticado talento; Howle confirmando a boa impressão que já deixara em "Dunkirk" (2017), de Christopher Nolan.