6 Jul 2020 23:55
A sua música ficou ligada a muitos títulos épicos do cinema; na verdade, ele próprio, tendo composto bandas sonoras para mais de quatro centenas de filmes, ao longo de seis décadas de trabalho, é uma personagem épica: o italiano Ennio Morricone faleceu na sua cidade natal, Roma, no dia 6 de Julho, na sequência de uma queda em fracturou o fémur — contava 91 anos.
O mínimo que se pode dizer do legado de Morricone é que não tem fronteiras. Literalmente: a sua imensa obra reparte-se pela produção europeia e pelo cinema de Hollywood, adaptando-se e, de algum modo, reinventando-se através dos muitos géneros — comédia, drama, melodrama, tragédia, etc. — em que trabalhou.
O leque de cineastas com que colaborou, em alguns casos acompanhando a respectiva evolução ao longo de várias décadas é também invulgar: Bernardo Bertolucci, Pier Paolo Pasolini, Marco Bellocchio, Roman Polanski, Brian De Palma… são apenas alguns dos nomes para cujos filmes compôs bandas sonoras essenciais na sua estrutura narrativa e vibração dramática.
Nascido a 10 de Novembro de 1928, a sua depurada formação clássica favoreceu uma actividade precoce como compositor: assina as primeiras composições em meados da década de 40, ainda mal saído da adolescência. Aliás, para lá do trabalho cinematográfico, deixa uma obra que inclui também uma multiplicidade de composições clássicas, incluindo peças sinfónicas e corais.
No imaginário cinéfilo, o seu conhecimento e reconhecimento é absolutamente indissociável da música dos "westerns spaghetti" em que colaborou com Sergio Leone, a começar, claro, pela lendária trilogia protagonizada por Clint Eastwood — "Por um Punhado de Dólares" (1964), "Por Mais Alguns Dólares" (1965) e "O Bom, o Mau e o Vilão" (1966) —, para desembocar, em 1968, no clássico absoluto que é "Aconteceu no Oeste" [poster].
Sobretudo a partir de "Dias do Paraíso" (1978), de Terrence Malick, passa a trabalhar em permanente ziguezague entre a Europa e Hollywood. Esse filme valeu-lhe, aliás, a primeira nomeação para o Oscar de melhor banda sonora. Voltou a ser nomeado por "A Missão" (1986), de Roland Joffé, "Os Intocáveis" (1987), de Brian De Palma, "Bugsy" (1991), de Barry Levinson, e "Malèna" (2000), de Giuseppe Tornatore.
Não ganhou com nenhum desses filmes, vindo a receber, em 2007, um prémio honorário da Academia de Hollywood "pelas suas magníficas e multifacetadas contribuições para a arte da música no cinema". De qualquer modo, ganhou mesmo um Oscar, em 2016, pela banda sonora de "Os Oito Odiados", também um "western", assinado por um dos seus admiradores de sempre: Quentin Tarantino.
Escusado será dizer que a quantidade imensa de bandas sonoras originais assinadas por Morricone não permite encerrá-lo num estilo ou tendência, muito menos em qualquer moda — ele foi, afinal, um criador que se quis sempre colocar ao serviço dos filmes a que dava o seu contributo. Eis cinco exemplos da pluralidade da sua herança.
* ‘Tema de Ada’, do filme "1900" (1976), de Bernardo Bertolucci.
* ‘Una Strana Copia’, do filme "A Gaiola das Malucas" (1978), de Édouard Molinaro.
* Tema-título de "Veio do Outro Mundo" (1982), de John Carpenter.
* "Os Intocáveis": cena da escadaria na Union Station, em Chicago.
* Tema-título de "A Missão", pela Orquestra da Rádio de Munique, sob a direcção de Ennio Morricone.